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Meio Ambiente

Bugio-ruivo é reintroduzido na natureza após mais de 260 anos de sua extinção local na Ilha de Santa Catarina

Na Ilha de Santa Catarina, atualmente está em curso um projeto de grande importância, o projeto de reintrodução do bugio-ruivo, espécie que, como salientado pela doutora Vanessa Kanaan, do Silvestres SC, não se encontrava mais presente naturalmente na ilha há mais de 260 anos. Em janeiro deste ano de 2024, os bugios Sem Cauda, Ranhento e Ruivo voltaram para a natureza, e em fevereiro mais uma família foi reintroduzida, sendo eles Sully Boo, Abandonado e Alegria. Em conversa realizada pelo Instagram do @silvestres.sc, entre a doutora Vanessa (Silvestres SC) e a bióloga Barbara Lima, coordenadora operacional do Projeto Fauna Floripa, informações de grande valia foram compartilhadas e apresentadas.

O projeto de reintrodução conta com a parceria do Projeto Fauna Floripa, que surgiu em 2019 e é integrado com três organizações, sendo elas a Universidade Federal da Santa Catarina – UFSC, Instituto de Meio Ambiente de Santa Catarina – IMA/SC, e a Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis – Floram. O Fauna Floripa realiza levantamentos de fauna em toda ilha, e os dados do levantamento da mastofauna serviram de base para a implementação do projeto de reintrodução dos bugios. Nestes levantamentos, constatou-se a extinção de outras espécies que hoje fazem parte dos planos do Silvestres SC para projetos futuros de reintrodução, um projeto grande que visa refaunar e devolver serviços ecossistêmicos perdidos à Ilha de Santa Catarina. A alta taxa de degradação levou muitas espécies a desaparecerem na ilha, e muitas não conseguem retornar naturalmente devido à barreira imposta pelo mar, o que foi o caso do bugio. O projeto, com suas pesquisas, provê subsídios para os projetos de translocação/reintrodução.

No planejamento de reintrodução de espécies, o primeiro passo a ser tomado é de buscar conhecer o melhor possível a região, quais espécies estão presentes, além de seus locais de ocorrência atuais e potenciais e preferências de habitat, e com essas informações organizar dados técnico-científicos que visem auxiliar órgãos ambientais e organizações não-governamentais especializadas em manejo de fauna, buscando alinhamento entre primeiro e terceiro setor. De posse desses conhecimentos, é possível analisar e pensar quais espécies estão faltando e o que pode ser feito para restaurar o ambiente de modo a contribuir que animais originalmente ocorrentes na área voltem a habitar o local.

Para atingir esses objetivos, parceiros forneceram armadilhas fotográficas para o projeto Fauna Floripa e com esses equipamentos foi realizado o planejamento de onde estes deveriam ser colocados e o que monitorar. Começaram com mamíferos e aves, que possuem conhecimento taxonômico suficiente para rápida identificação e obtenção de volume de dados. A partir de discussões realizadas por integrantes do Fauna Floripa e pela pesquisa de doutorado da Talita Góes, foram escolhidas áreas com remanescentes de mata primária, onde a mata encontrava-se mais conservada na ilha e quais os habitantes desses locais, pois nessas áreas mais preservadas, algumas espécies podem ser muito exigentes ecologicamente, resistindo pouco às mudanças que a ilha sofre. Além de investigar a fauna nas áreas mais preservadas, foram averiguadas também as áreas mais degradadas, a fim de realizar um raio-x pela ilha.

Para realizar a soltura de um animal, há todo um trabalho por trás e, como salientado pelas pesquisadoras, são muitos anos de preparação e estudos, buscando diminuir a chance de colocar animais e o meio ambiente em risco. Durante todo o processo de mapeamento da flora e fauna da ilha, pelo Fauna Floripa, acabam surgindo perguntas, inclusive para além do que tinham pensado inicialmente. Essas perguntas resultaram em quatro Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC), um mestrado, doutorado, além de muitos outros que serão gerados. Faz-se necessário, como se pode concluir, de uma equipe interdisciplinar, envolvendo áreas tais como geografia, ecologia, zoologia e a capacidade de coordenação para juntar organizadamente tudo o que envolve este trabalho. Barbara e Camila começaram com esta tarefa de organização, na coordenação operacional, pensando também em como tornar reprodutível.

Sobre as características da ilha, Barbara compartilha informações de algumas das áreas da ilha, como é o caso da Cachoeira Bom Jesus, onde a floresta é mais nova, sendo chamada de secundária, enquanto as florestas no entorno e região da Lagoa do Peri são maduras, uma vez que sofreram menos com pressões antrópicas. Há características diferentes nesses locais, tanto por toda ilha como comparando com continente. Todas essas informações, assim como muitas outras, foram obtidas por meio de muita dedicação, como a ida de 120 vezes a campo, cuidando dos pontos para obtenção de fotos e vídeos pelas armadilhas fotográficas com sensor infravermelho, além do planilhamento de dados e análises.

No total, foram obtidos 13 mil vídeos através de armadilhas fotográficas, as quais são acionadas quando “algo” se movimenta na sua frente, de forma que tanto animais quanto plantas podem ser registrados. Nos acionamentos das armadilhas fotográficas, foi possível inclusive verificar os efeitos do ciclone que ocorreu em 2019 na região, ocasião em que houve uma intensa queda árvores gigantes e cipós. Dessa forma, foi necessário verificar cada um dos 13 mil vídeos excluindo registros que não fossem de animais, havendo a redução para o total de 4,5 mil. Dentre os mamíferos observados, foram capturadas 20 espécies de médio e grande porte, além de algumas de pequeno porte, como a Marmosa paraguayana (cuíca). A capivara é a maior espécie de mamífero na ilha, onde não há predador, acabando por ocasionar um desequilíbrio, adicionado ao fato de não haver predadores para a espécie, que há 15 anos atrás não eram encontradas na ilha. Anteriormente, havia o puma e a onça-pintada para predá-los.

Com todo este trabalho realizado ao longo dos anos e informações e conhecimentos adquiridos, Barbara declara que a soltura do bugio é um sonho compartilhado, sobre a importância de trazer as espécies de volta e a necessidade de sensibilizar as pessoas. O bugio é uma espécie dispersora de semente, como de sementes grandes de árvore, a exemplo da canela-preta (Ocothea catharinensis), uma árvore ameaçada de extinção, e contribui com a resiliência e manutenção do ecossistema. Assim, essa espécie acaba realizando serviços ecossistêmicos, uma vez que contribui na retenção da água e ciclagem de nutrientes, proporcionando mudanças globais positivas em todos os locais.

Há seis grupos de bugios na fila de soltura, sendo três famílias a serem soltas no norte da ilha, no Parque Estadual do Rio Vermelho e também três famílias na Lagoa do Peri. A intenção é que se estabeleça uma nova população, além de que essa iniciativa pode proporcionar um embelezamento da cidade e incentivar turismo de observação de fauna em Florianópolis com intuito educacional. As pesquisadoras destacaram também a importância do trabalho com comunidades ao entorno dos parques de conservação, de modo que entendam a relevância do trabalho que vem sendo feito com o impacto positivo proporcionado ao meio ambiente. Além disso, com o trabalho na comunidade, será incentivado a ciência cidadã, que consiste no incentivo da ajuda da população no monitoramento dos bugios. Por isso, sempre que uma pessoa encontrar um bugio ou ouvir sua vocalização na ilha, deve relatar ao @silvestres.sc.

Os bugios reintroduzidos na ilha após 260 anos de sua ausência serão constantemente acompanhados buscando o seu sucesso vivendo livremente na natureza.

Assista à conversa completa no Instagram clicando aqui.

Conheça o Instituto Fauna Brasil.

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