Em estudo capitaneado por pesquisadores da UNIFESP, bitucas de cigarro compuseram 50% dos resíduos encontrados em mutirão realizado em praia na região de Santos-SP
Em conversa com o Professor Ítalo Braga de Castro, da UNIFESP, Natália Zafra, idealizadora do Mundo SEM Bitucas, busca fazer uma ponte entre o conhecimento da academia e a sociedade civil sobre a geração de resíduos sólidos principalmente em relação aos impactos relacionados às bitucas de cigarro.
Vale a pena citar, mesmo que de forma breve, a constante e crescente geração de resíduos que nós, inseridos no que chamamos de mundo civilizado, produzimos. Há a tendência, lembrando do consumismo de que somos e deixamos ser afetados, sendo diariamente incitados a mantê-lo firme em nós por diversos canais da mídia, que o crescimento da população seja seguido de perto do aumento da produção de resíduos sólidos. Quanto à quantidade, para dar um exemplo, dados nos mostram que produzimos no Brasil cerca de 1kg a 1,5kg de resíduos por dia por pessoa. Todo esse material, teoricamente, deveria receber o devido tratamento, e ser depositado atendendo aos melhores padrões em todo o país, o que sabemos não acontecer, mesmo com o advento da Lei nº 12.305/2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Como nos mostra o Professor Ítalo, que sempre fez trabalhos relacionados à contaminação por substâncias químicas, os materiais orgânicos são maior parte destes resíduos quando se considera uma média mundial. Mas há de se considerar uma diferença quando são levadas em conta as zonas costeiras. Nesse caso, o principal item de acordo com algumas pesquisas, são os plásticos, sendo também a bituca de cigarro uma fração importante desses resíduos sólidos encontrados em campanhas de limpeza. Segundo o professor, há regiões em que as bitucas inclusive ultrapassaram o plástico.
Entre os componentes dos cigarros estão os filtros. Cerca de 90% desses filtros usados no mundo são feitos de acetato de celulose, que não pode ser considerado um material degradável por persistir muito tempo na natureza para se decompor. Além disso, esse componente possui diversas substâncias tóxicas, lembrando que ele tem a função de reter algumas substâncias químicas (estima-se haver 7.000 delas em um cigarro) que são produzidas ao ser acendido.
Dados apresentados durante a conversa entre Natália e Ítalo estimam a existência de 1,4 bilhão de fumantes no mundo, sendo produzidas 4,5 trilhões bitucas de cigarro por ano. São números expressivos e preocupantes. Nas palavras do professor, uma bituca de cigarro trata-se de uma “bombinha química” cheia de substâncias que são perigosas, não só para o ser humano, mas para o meio ambiente de maneira geral. Animais que não deveriam ser atingidos por esse comportamento acabam interagindo com esses resíduos, que possuem algumas substâncias com potencial de se bioacumular no organismo e potencialmente trazer danos também no longo prazo.
O pesquisador e sua equipe verificaram em um dos seus mutirões realizados na região de Santos e São Vicente que mais de 50% dos resíduos, na época do verão, eram compostos por bitucas de cigarro. Esse mutirão fez parte do projeto de pesquisa de ciência cidadã elaborado na universidade, com a presença de cerca de 500 pessoas simultâneas em praias das cidades citadas.
Como observado por Ítalo, em testes de toxicidade realizados com espécies de crustáceos de tamanho quase microscópico, foi verificado que, em alguns casos, uma quantidade de bituca que seria o equivalente a 0,01 bituca foi suficiente para causar consideráveis danos tanto para os organismos vivendo na água, quanto aos que viviam nos sedimentos. Mais pesquisas vêm sendo desenvolvidas na UNIFESP e estarão disponíveis para contribuir ainda mais no aumento de conhecimento sobre a problemática deste resíduo.
O projeto de pesquisa em que foram feitas essas análises foi financiado pela FAPESP e composto por alunos de mestrado do Programa de Pós-graduação em Biodiversidade e Ecologia Marinha e Costeira (PPGBEMC) da UNIFESP.
O texto foi elaborado a partir das informações trazidas e difundidas por meio da ação do projeto Mundo SEM Bitucas, idealizado há mais de cinco anos. Como dito por Ítalo, “Às vezes cientistas não tem muita familiaridade com ferramentas de disseminação de conhecimento”, e o projeto vem para contribuir nesse sentido de difusão de informações. Apenas assim é possível conscientizar a população sobre seu papel.
Uma das formas de contribuir com a educação ambiental se trata da realização de mutirões: “Os mutirões de limpeza, como os realizados pelo Mundo sem Bitucas, são uma forma de intervenção, de chamar a atenção da população”, diz Natália. Em um desses mutirões, ela nos informa que foram coletadas mais de 10.000 bitucas em 30 minutos na região do MASP em São Paulo. Foi inclusive elaborada uma “Montanha da Vergonha”, que serviu como mais uma forma de chamar a atenção das pessoas tendo em vista a busca da harmonização de nossa relação com a natureza. Continue acompanhado a iniciativa nas redes sociais clicando aqui!
Confira toda a apresentação na página do Mundo Sem Bitucas no Youtube.
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