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Meio Ambiente

Desmatamento cresce nas regiões próximas a estradas no Brasil, diz pesquisa

Um artigo científico publicado em março no periódico Science Advances revelou os resultados da primeira pesquisa que mapeou detalhadamente áreas livres de estradas em todos os seis biomas brasileiros. A partir da identificação de áreas localizadas entre 1 e 5 quilômetros em relação a rodovias, ferrovias e estradas menores, os pesquisadores constataram que, quanto maior a distância entre as áreas estudadas e a infraestrutura de transporte, menor a probabilidade de encontrar a região desmatada e maior a presença de vegetação nativa. Eles também apontam que, embora áreas livres de estradas e ferrovias detenham a grande maioria da vegetação nativa remanescente do país (81,5%), apenas 38% dessa vegetação se encontra protegida por algum instrumento legal (unidades de conservação, terra indígena). O estudo foi realizado em parceria entre pesquisadores da UFRGS e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Um dos principais desafios do grupo de pesquisadores foi a coleta de informações aprofundadas dos biomas Pampa, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica e Pantanal, visto que existem mais estudos a respeito das relações das rodovias e ferrovias com o desmatamento na Amazônia, nos quais os dados apontam desmatamento na faixa de até 5,5 km junto às estradas. Os pesquisadores, então, buscaram avaliar mais a fundo o impacto do transporte ferroviário em todos os seis biomas do país, já que havia uma lacuna na literatura acadêmica a respeito desse contexto.

As análises do estudo mostram que as áreas protegidas – como territórios quilombolas, unidades de conservação e terras indígenas – têm participação direta na conservação da fauna e flora local, impactando positivamente nas regiões próximas às estradas quando comparadas às propriedades rurais privadas. Somado a isso, a pesquisa buscou regiões onde seria possível realizar restaurações ecológicas de resultado imediato sem que se prejudicasse a propriedade privada de terras, com os objetivos de melhorar o ecossistema e atingir metas de conservação propostas atualmente pelo Governo Federal.

O estudo alega que existe um consenso de que o impacto de estradas e ferrovias é mais prejudicial quando essas rotas são inseridas em ecossistemas intactos e remotos. Diante disso, o país pode ser altamente afetado pelos planos de expansão mundial das redes rodoviárias e ferroviárias, já que 90% dessas futuras infraestruturas de transporte devem passar por regiões tropicais em ecossistemas praticamente intocados até então.

Para a pós-doutoranda ligada ao Programa de Pós-graduação em Ecologia da UFRGS e coautora do artigo Fernanda Teixeira, os altos percentuais de desmatamento passam diretamente pelo desinteresse da classe política por pautas ambientais. “Temos um planejamento de transporte que não é transparente e que não considera questões ambientais desde o início”, comenta a pesquisadora, que reforça a necessidade de recursos e equipamentos para uma efetiva fiscalização ambiental.

Trevor Tisler, mestre em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais pela UFMG e coautor do artigo, comenta que os planejamentos de transporte são os mesmos desde a época da ditadura militar.

“Emissão de carbono deveria fazer parte do planejamento de transporte, mas só se consideram assuntos como o gasto de gasolina, petróleo, e não são levados em consideração outros aspectos ambientais, como mudança de uso do solo, impactos na biodiversidade e as barreiras que podem ser criadas no ecossistema com mais emissões de carbono”

Trevor Tisler

Ele ressalta que as licitações vencidas por empresas privadas para a realização de estradas deveriam prever estímulos econômicos para a execução de medidas de preservação ambiental. Outra possibilidade apontada por Trevor é o aproveitamento das estradas já existentes para uma futura expansão das rodovias, a fim de mitigar os impactos ambientais.

Fernanda cita que no Rio Grande do Sul há uma proposta – já aprovada – de mudança no licenciamento ambiental, deixando de ser necessárias três licenças prévias de operação e instalação, o que enfraquece as políticas ambientais. Ela complementa que a política ambiental possui uma série de pontos a serem melhorados, mas que essas falhas deveriam justificar mais investimentos e reforço dos licenciamentos, e não o fim deles.

Os pesquisadores também destacam a importância de avaliar o contexto específico de cada bioma dentro de um padrão nacional de planejamento adequado, em lugar de tratar todas as concessões e avanços da infraestrutura de forma única em um país continental. Para colaborar nessas questões, evidenciar problemas e apontar soluções, Fernanda ressalta que existem núcleos de pesquisa que buscam coletar dados sobre os temas relacionados à fauna e à flora.

Um desses grupos é o Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF) da UFRGS, cujo trabalho vem crescendo ao longo dos anos e que já realizou workshops sobre animais atropelados em rodovias e ferrovias. “Ainda estamos engatinhando nessa questão, mas se colocar todos os responsáveis [pelo licenciamento ambiental] na mesma mesa e mostrar a importância disso [preservação da fauna], é possível chegar em um acordo sobre como deve ser feito, para quando o IBAMA exigir isso, já esteja acordado”, aponta a pós-doutoranda.

Fonte: Gabhriel Giordani – Jornal da Universidade – UFRGS.

Confira também: Pesquisa da UFRGS e UEA aponta que fungos da casca-preciosa podem ser capazes de degradar plástico

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