Biocarvão de café recupera solo contaminado com metais pesados
Dois tipos de biocarvão obtidos a partir de resíduos da cadeia do café, borra (resíduo gerado na produção de café solúvel) e pergaminho (gerado na despolpa úmida do café), incorporados ao solo se mostraram eficientes na redução de contaminação por metais pesados e na melhoria da sua qualidade. O biocarvão pode ser obtido a partir de qualquer biomassa, como os resíduos da cadeia do café, em alinhamento com conceitos de responsabilidade socioambiental, economia circular e sustentabilidade.
De acordo com os pesquisadores, os resultados referentes aos níveis de cálcio, cobre, carbono orgânico e atividade das enzimas desidrogenase e protease foram utilizados como base para calcular um Índice de Qualidade do Solo (IQS), permitindo avaliar os impactos dos biocarvões. A amostra de solo com biocarvão de pergaminho de café apresentou o IQS mais elevado, porém ambos conseguiram reduzir a concentração de metais no solo, contribuindo para a melhoria de sua qualidade.
A pesquisa foi conduzida sob a liderança de Aline Coscione do Instituto Agronômico (IAC), em colaboração com a Embrapa Meio Ambiente. O experimento estendeu-se por 90 dias e até o momento desse estudo havia uma compreensão limitada sobre do uso do biocarvão (em inglês, biochar) para a melhoria da qualidade do solo, mensurada por meio do IQS.
Segundo Cristiano Andrade, pesquisador da Embrapa Meio Ambiente, a qualidade do solo refere-se à sua capacidade de desempenhar funções, como o suporte a produção vegetal e a regulação do fluxo de água no ambiente, importantes para o equilíbrio do ecossistema. Dessa forma, índices de qualidade podem ser pensados no sentido de combinar variações em atributos do solo e medida de desempenho de uma ou mais funções no ambiente. Isso vem sendo tratado pela equipe na evolução das pesquisas.
As atividades enzimáticas, por exemplo, desempenham papel crucial na ciclagem de nutrientes e, por conseguinte, na manutenção da fertilidade do solo. A enzima desidrogenase é particularmente importante nos processos bioquímicos, pois está ligada à oxidação da matéria orgânica. Já a enzima protease está envolvida no ciclo do nitrogênio no solo. O teor de cálcio está estreitamente relacionado à produção agrícola, especialmente em solos tropicais, que são naturalmente ácidos e apresentam níveis insatisfatórios de nutrientes. O cobre, embora seja um micronutriente, pode tornar-se tóxico em concentrações elevadas.
Na obtenção do IQS, a abordagem para as enzimas é “quanto maior, melhor”, uma vez que estão relacionados à ciclagem de nutrientes e, consequentemente, ao desenvolvimento das plantas. Para o cobre, a abordagem é de “faixa desejada de teores”. Nesse último caso, prejuízos à qualidade do solo ocorrem para valores menores ou superiores aos limites da referida faixa para o cobre.
De acordo com Ruan Carnier, um dos desenvolvedores da pesquisa como aluno de doutorado do IAC e hoje colaborador na Embrapa, a atividade da enzima desidrogenase alcançou pontuação muito baixa em todos os tratamentos, com valores abaixo do limite estabelecido. “Sendo uma enzima intracelular, explica Carnier, ela reflete diretamente a atividade dos microrganismos e é altamente sensível a mudanças. Assim, neste estudo, a reduzida atividade da enzima foi principalmente atribuída à toxicidade dos metais presentes no solo”.
Os biocarvões utilizados são alcalinos, explica Carnier. “Quando adicionados ao solo, os biocarvões elevam o pH do meio o que consequentemente reduz a disponibilidade de metais pesados. Além disso, os biocarvões tem características especificas como porosidade e grupos funcionais na sua superfície, o que contribui para a absorção de metais pesados, reduzindo a disponibilidade no solo”.
O trabalho completo de Ruan Carnier, Cleide Aparecida de Abreu, Ana Olivia Fernandes, Adriana Parada Dias Silveira e Aline Renée Coscione (Instituto Agronômico – IAC), Cristiano Alberto de Andrade (Embrapa Meio Ambiente), pode ser acessado aqui.
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